segunda-feira, 27 de julho de 2020

Quando a Notícia Despiora os Hipônimos

                                                     

A escolha das palavras é algo importante, diz muito sobre o emissor da mensagem, sua opinião implícita, seus valores, repertório linguístico, intenções e por aí vai. Quando o emissor faz a mensagem em veículos de comunicação em massa, essas escolhas são mais delicadas, não ofender, não elogiar muito, tentar imparcialidade, questões estéticas e eufonia são constantes. A folha publicou uma notícia sobre o presidente Bolsonaro e causou certa estranheza o uso de um verbo não muito comum: despiorar.

                O uso de palavras não usuais não é algo comum no jornalismo, sobretudo quando há sinônimos. Além de usar o termo “despiora econômica”, sendo que em economia tal termo também não é usual. Despiorar não é um sinônimo de melhorar e nos remete a um ambiente diferente, bem diferente.

                Isso que chamo de ambiente, refere-se ao mundo da semântica, as palavras possuem campos semânticos, que ora são ligados a sua estrutura, ora são do senso comum, a unidade destes campos é o sema, assim quando digo a palavra jornal, os semas possíveis são: notícia, reportagem, fato, título, etc. Esses semas podem ser agrupados do geral para o específico e do específico para o geral, dependendo da hierarquia temos os hipônimos e os hiperônimos. Por exemplo: roda, volante, freio, escapamento – são palavras que nos remetem a palavra carro. Esse termos específicos ( roda, volante, etc) são chamados de hipônimos e o termo mais geral (carro) de hiperônimo.

                Voltando para o caso do verbo despiorar, assim teremos para o hiperônimo despiorar  os hipônimos (menos ruim, não tão grave, amenizar, etc). Se a escolha fosse o adjetivo de superioridade “melhor” teríamos como hipônimos: superior, supremo, máximo, bom, etc. A escolha revelou que nem de forma remota o jornalista pensou em elogiar o presidente!

               


segunda-feira, 20 de julho de 2020

As preposições e o vírus chinês

                                                

           A preposição é uma palavra que não tem variações de plural, nem de gênero, mas possui em si noções relacionadas ao sentido. Assim temos: falavam com pudor, falavam de pudor, falavam sem pudor. As preposições (com, de, sem) conseguem mudar a relação entre as palavra, o que exige um contexto específico, mas também cria confusões específicas.

      Uma confusão, ou problema de trato com a informação, ocorreu com a prefeitura de Porto Alegre. A prefeitura publicou em sua conta no twitter o 196º óbito de paciente com coronavírus, porém no final da nota duas informações geraram um certo conflito: exame positivo para coronavírus e paciente com linfoma. Um parente da pessoa referida entrou em contato, pelo próprio twitter, alertando que a referida pessoa não morreu por causa do vírus chinês.


     A prefeitura então respondeu usando duas preposições diferentes: em nenhum momento dissemos que foi DE corona, mas COM corona. Nesse caso as preposições, de fato, indicam coisas distintas, morreu De corona (preposição indica causa). Morreu COM corona ( preposição indica companhia) é o que chamamos de valores semânticos da preposição.

       Claro que fica a dúvida de contabilizar DE e COM, ou seja, a prefeitura contabiliza quem morre pela causa e com o vírus!  Podemos perceber que as preposições e seus valores semânticos continuam a causar conflitos. 

(Ricardo Gomes)